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Carlos Alberto de Nóbrega recorda início da TV e diz que escreverá livro sobre sua vida

Apresentador de A Praça É Nossa vai transformar as memórias de sua carreira em um livro que começou a escrever durante a quarentena


Por Folhapress Publicado 20/09/2020
Foto: Divulgação/SBT

Às vésperas de o Brasil celebrar os 70 anos da inauguração da TV no país, o apresentador Carlos Alberto de Nóbrega, 84, se lembra de quando se mudou com a família para Nova York, nos Estados Unidos, em 1945, onde moraram de maio a dezembro daquele ano. Foi lá que ele ouviu falar, pela primeira vez, sobre a “tal” televisão.

“Meu pai ganhou uma bolsa ainda durante a Segunda Guerra Mundial para estudar nas rádios NBC e CBS. Foi quando ouvimos falar dessa coisa de televisão, de ver imagens em casa. Já estava começando essa ideia da TV, mas era o começo do começo. Era uma coisa absurda pensar: ‘como é que você vai ver imagem em casa?’. Desde essa época que eu já sabia dessa possível vinda [ao Brasil] desse aparelho maluco que teríamos em casa”, afirma o apresentador de A Praça É Nossa (SBT).

Até então, no Brasil, Carlos Alberto conta que para ver imagens em uma tela era preciso ir ao cinema. “Assistíamos às notícias no cinema. Vi soldados indo para guerra no Rio de Janeiro, vi aqueles caminhões levando a garotada e as mães chorando. Daí mudamos para São Paulo em 1944, quando a guerra já estava quase acabando.”

Dez anos depois, ele e seu pai já estariam trabalhando naquele novo meio de comunicação, na área de humor, após a inauguração da primeira estação de TV do país, a Tupi, em 18 de setembro de 1950. E Carlos Alberto lembra do primeiro comediante da TV brasileira, segundo ele: Walter Stuart. “Ele era sensacional, vamos incluir a participação dele nas reprises de A Praça É Nossa.”

Ele lembra, ainda, de alguns dos atores precursores da televisão, como Lima Duarte, Wálter Forster, Lara Cardoso e Hebe Camargo. Dessa última, ele se lembra de uma história polêmica.

“No dia da inauguração da TV Tupi [em 18 de setembro de 1950], a Hebe estava escalada para cantar um hino feito especialmente para a ocasião. Mas ela estava apaixonada e preferiu ficar com o [empresário] Luís Ramos em Santos, onde ele tinha um compromisso. Ela foi substituída pela amiga Lolita Rodrigues”, lembra Carlos Aberto sobre um dos episódios mais conhecidos da cerimônia, e ainda revela que Hebe e Ramos foram os padrinhos de seu primeiro casamento, em 1947.

O apresentador e roteirista também fala do pioneirismo de seu pai, Manoel de Nóbrega, no humor. Foi ele quem criou A Praça da Alegria, em 1956, após uma viagem de férias a Buenos Aires, na Argentina. Desse programa, saíram personagens lendários como Apolônio (Viana Júnior), Bronco/Pacífico (Ronald Golias), Catifunda (Zilda Cardoso) e a Velha Surda (Roni Rios).

“Não é por ser meu pai, mas ele tinha uma inteligência única e uma criatividade fértil”. diz Carlos Alberto.

O apresentador conta que o programa nasceu quando Luís Ramos e Victor Costa, donos da TV Paulista (embrião da Rede Globo) e da Rádio Nacional, queriam um humorístico. “Meu pai fazia um programa de prêmios chamado ‘Não Durma no Ponto’. Aí eles queriam fazer programa de humor, porque não tinha [esse tipo] na TV Paulista.”

Carlos Alberto conta que era dezembro quando eles falaram com Manoel de Nóbrega, que respondeu que ia sair de férias, mas ia bolar algo e voltar com um programa novo. “Victor disse que precisava para janeiro, porque o programa já estava vendido para a União Fabril Exportadora, que daria nome ao programa.

Veja se isso é nome de programa de humor?”, indaga Carlos Alberto.
Em Buenos Aires, conta, Nóbrega observava uma praça da janela do hotel e viu um homem que ficava conversando com o jornaleiro. “Todo mundo conhecia ele na região, todos paravam para conversar com ele. Foi daí que surgiu Praça da Alegria, que é eterna, porque em uma praça sempre passarão pessoas com histórias interessantes. Esse é o segredo, né? A simplicidade. Porque basta um banco e um cenário atrás.”

O humorístico de Nóbrega criou um modelo que existe até hoje e foi herdado por Carlos Alberto de Nóbrega em A Praça É Nossa, do SBT. Mas para ele, ao comparar a época de seu pai e de atualmente, o humor se perdeu ao longo dos anos. “Mudou para pior, ficou uma coisa eletrônica hoje. Com esse negócio de politicamente correto, vai piorar cada vez mais. Hoje em dia você não teria ‘Os Trapalhões’ no ar”, afirma o apresentador que escreveu e dirigiu a trupe, na Globo, por 11 anos.

DECEPÇÃO APÓS A MORTE DO PAI

Um ano após a morte de Manoel de Nóbrega, Carlos Alberto conta que seria feita uma missa transmitida no Jornal Nacional, mas a então Rede Globo afirmou que Nóbrega era muito alegre e merecia uma honraria mais divertida. “Vamos lembrar teu pai com alegria”, teria dito o executivo José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, a Carlos Alberto, sugerindo a homenagem no programa Chico City.

O filho de Nóbrega foi encarregado de falar com Chico Anysio, que prontamente aceitou fazer um programa inteiro recebendo convidados, como fazia Nóbrega.

“Era Carnaval e voltei para São Paulo para vasculhar uns baús de textos que ele tinha, porque eu nunca tinha escrito a Praça. Só o substitui uma vez, quando ele ficou doente. Aí escrevi e fiz por ele. Mas foi uma única vez, porque ele tinha muito ciúme da Praça, tanto quanto eu. Eu acho que tenho até mais que ele”, afirma Carlos Alberto sorrindo.

O especial foi um sucesso. “Um dia fui pro Rio para fazer o trabalho com ‘Trapalhões’, e tinha um recado para eu ir ver o Boni. Cheguei lá e ele disse: ‘Doutor Roberto [Marinho] adorou o programa e quer que a gente faça um semanal. Volta para São Paulo, corre atrás de quem quiser trazer, se for do Rio, melhor’. Mas eu não fazia ideia do que estava por vir.”

Carlos Alberto conta que pensava que era ele quem iria sentar no banco, já que era implícito que ele seria o substituto natural do pai. “Não tinha outra pessoa para fazer que não fosse eu, até porque eu já tinha um programa. Eu achei que ia sentar naquele banco pelas afinidades com o meu pai, pela história que tínhamos.”

Mas Carlos Alberto se decepcionou quando voltou ao Rio e teve uma reunião com Boni, que logo anunciou que “achava melhor que fosse o [Luís Carlos] Miele” para apresentar. “Quando o Boni dizia ‘eu acho’, era porque já era.”

Carlos Alberto tentou argumentar, mas Boni respondeu que não sentariam no banco nem Chico Anysio, que já estava com dois programas, e nem Carlos Alberto. “Ele me disse que se fosse um fracasso, minha carreira ia acabar. Se fosse um sucesso, iriam dizer que não era vantagem, porque o programa já era famoso. Ele queria alguém completamente diferente do Nóbrega.”

Carlos Alberto confessa que foi um baque. “O Miele fez com muita dignidade, muito bem, mas ele não gostava desse tipo de humor, porque ficava amarrado ali no banco. Ele tinha humor mais americano, de stand-up comedy.”

Ele conta que aquele foi um dos piores momentos de sua vida. “Só não foi o pior momento, porque esse foi quando perdi meu pai e minha mãe [Dalila Afonso de Nóbrega] para o câncer em um espaço de nove meses. Perdi meu pai em março e minha mãe em dezembro. Foi a fase mais difícil da minha vida.”

Carlos Alberto conta que nessa época morava em São Paulo, mas ficava grande parte da semana no Rio, em um hotel. “Quando ia dormir, muitas e muitas vezes, eu sonhava que estava assistindo à Praça no Teatro Fênix, no Rio. Meu pai aparecia e eu dizia para ele voltar ao lugar dele [o banco da Praça]. Mas ele dizia que não, que o Miele estava indo tão bem. Eu sonhava muito. Tinha uma dificuldade muito grande [em aceitar as perdas].”

MEMÓRIAS QUEIMADAS

“Posso dizer um palavrãozinho?”, diz Carlos Alberto aos risos. Ele conta que a forma como o programa estava sendo conduzido o afetou a tal ponto que ele destruiu os roteiros originais do programa do pai.

“A Globo nunca engoliu [a Praça da Alegria]. Nunca, nunca. Até que começaram a botar a mão. Queriam fazer com padrão global e eu comecei a ficar irritado e chateado, porque estava fugindo da proposta original.”

Carlos Alberto conta que voltou a São Paulo, onde havia dois baús enormes em sua casa com os textos da Praça da Alegria. “Eu tinha um terreno ao lado de casa, que era do meu pai, peguei motorista e levei tudo para lá. Botei fogo nos dois baús e falei: ‘Nunca mais filho da puta nenhum vai usar texto da Praça. Anos depois, o filho da puta era eu, que comecei a fazer”, diz sorrindo.

“Não ficou um texto para contar a história. Eu estava muito mal. Perder meus pais com 40 anos, me separando da minha [primeira] mulher, eu estava muito triste. Tive que começar uma guerra para sobreviver”, admite.

Por fim, o apresentador conta que vai transformar as memórias de sua carreira em um livro que começou a escrever durante a quarentena. “Vou falar tudo isso. Tenho 30 páginas e quatro capítulos. É muita coisa, vou contar minha história artística, o que vi, o que aconteceu, as dificuldades, as alegrias e os truques que fiz para conseguir determinadas coisas.”

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