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Partido com seis deputados usou dinheiro público para comprar carro de R$ 260 mil

Uma das mais minúsculas siglas da Câmara, com seis deputados, o Patriota (ex-Partido Ecológico Nacional) comprou por R$ 260 mil, à vista, uma Mitsubishi Pajero Sport zero km


Por Estadão Conteúdo Publicado 10/08/2020
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O Brasil tem um rombo bilionário nas contas públicas. Estados e municípios atrasam salários de servidores e, sem dinheiro para necessidades básicas, ameaçam quebrar. Esse cenário de penúria acentuada, porém, não impediu que um partido como o nanico Patriota usasse R$ 260 mil do dinheiro público para comprar, à vista, uma Mitsubishi Pajero Sport zero km.

Uma das mais minúsculas siglas da Câmara, com seis deputados, o Patriota (ex-Partido Ecológico Nacional) apregoa como bandeira a eficiência na gestão, com o menor gasto possível para a promoção de bens e direitos, e a “verdadeira austeridade fiscal com busca ao déficit nominal zero”.

A sua prestação de contas de 2019, porém, aponta a aquisição de cinco carros. Além da Pajero de R$ 260 mil, foram outros quatros veículos, a preços unitários de R$ 29 a R$ 124 mil. Ao todo, desembolsou R$ 644 mil de verba pública.

O presidente da sigla, Adilson Barroso, justificou as compras dizendo que “toda empresa que queira ter resultado em seu trabalho tem que ter as ferramentas necessárias”.

O gasto é um dos exemplos de dispêndios luxuosos promovidos por várias das 33 siglas, que têm à disposição uma verba anual de cerca de R$ 1 bilhão (fundo partidário), além de outros R$ 2 bilhões a cada dois anos para gastos de campanha (fundo eleitoral).

Como a Folha mostrou neste domingo (9), entre os gastos dos partidos há pagamento de salários de dirigentes, empresas vinculadas a eles, parentes, amigos e parlamentares que fracassaram nas urnas.

A Folha analisou dados das prestações de contas partidárias de 2019 coletados e compilados pela ONG Transparência Partidária, nas três esferas, nacional, estadual e municipal.

Dono da maior fatia do bolo, por ter tido o melhor desempenho na campanha para a Câmara em 2018, o oposicionista PT lidera os gastos em rubricas como viagens (R$ 1,57 milhão), propaganda (R$ 6,2 milhões) e advocacia (R$ 6,1 milhões). Já o rival PSDB foi o campeão de gastos com o pagamento de multas (R$ 709 mil) e pesquisas de opinião (R$ 1,48 milhão).

O MDB do ex-presidente Michel Temer foi o que, nacionalmente, mais gastou no ano passado com eventos (R$ 5 milhões) e na rubrica de reforma ou aquisição de sedes próprias, em especial a do Ceará, terra do ex-tesoureiro da sigla e ex-presidente do Senado, Eunício Oliveira (R$ 396 mil).

O mais caro evento do partido foi a convenção nacional que elegeu o atual presidente, Baleia Rossi (SP), em outubro, tendo custado R$ 1,5 milhão.
O PSD de Gilberto Kassab foi o que mais gastou com aluguel de imóveis, R$ 2,3 milhões.

O Pros, investigado sob suspeita de desvio de recursos, também esbanjou. Foram R$ 307,5 mil para reforma ou aquisição de sede própria e R$ 155 mil para compra de um veículo. O partido criado em 2013 pelo ex-vereador de Planaltina de Goiás (a 60 km de Brasília) Eurípedes Júnior já havia se notabilizado em 2015 por gastar R$ 2,4 milhões de dinheiro público para comprar um helicóptero.

O Republicanos foi o que mais gastou nas rubricas aquisição de equipamentos (R$ 1,2 milhão) e manutenção de imóveis (R$ 2 milhões). “As avaliações sobre a aquisição de bens ou serviços específicos pelos partidos, principalmente quando envolvem recursos públicos, devem sempre considerar fatores como o princípio da moralidade, a finalidade da atuação da instituição, a economicidade do gasto, eventuais conflitos de interesse e, finalmente, o porte e a estrutura da legenda em comparação com as demais”, afirma o diretor-executivo da Transparência Partidária, Marcelo Issa.

“Como regra geral, no entanto, é possível afirmar que bens luxuosos ou supérfluos são em qualquer caso incompatíveis com os parâmetros.”
Outro lado

Adilson Barroso, do Patriota, justificou o gasto de R$ 644 mil com automóveis afirmando que “toda empresa que queira ter resultado em seu trabalho tem que ter as ferramentas necessárias para o mesmo”.

De acordo com ele, “aparece um valor mais alto do que de fato” se gastou pois “um dos veículos da legenda foi acidentado e o seguro devolveu o valor integral”, que teria sido usado na transação.

“O carro de maior potencial, também não vejo nenhum problema, vendo que nosso país é um pais continental e de estradas ruins, e para não termos problema com o veículo em tantas viagens compramos um carro mais resistente”, afirmou Barroso.

O PT justifica os gastos de viagem e comunicação afirmando ter uma ampla estrutura, com 2,4 milhões de filiados, 27 diretórios regionais, 3.241 diretórios municipais, 27 regionais e 16 setoriais nacionais. “As políticas do partido são debatidas e definidas em processos de âmbito nacional porque o PT é de fato um partido de âmbito nacional com um projeto para o país”, disse a assessoria de imprensa.

“Em 2019, além das reuniões ordinárias do Diretório Nacional em Brasília e São Paulo, foram realizados o 7º Congresso do PT e 16 encontros e reuniões nacionais de setoriais temáticos (mulheres, juventude, cultura, por exemplo), entre outras atividades com despesas de viagem e hospedagem”, acrescentou.

Sobre os gastos com advocacia, o partido disse que defende os direitos da população em 79 ações constitucionais no STF (Supremo Tribunal Federal) e “só neste ano ajuizou 48 ações em defesa da saúde pública ameaçada pelo governo na pandemia”, além dos gastos judiciais decorrentes das eleições no país.

A sigla do ex-presidente Lula disse ainda que defende o financiamento público dos partidos como conquista democrática. “A tentativa de desmoralizar e até criminalizar este modelo corresponde à visão autoritária de partidos financiados e privatizados por setores poderosos da sociedade. A informação correta faz mais pela democracia do que a elaboração de ‘rankings’ direcionados por organizações que nem sempre cumprem a transparência que pregam.”

O MDB disse, em nota, que os gastos não correspondem exclusivamente ao diretório nacional e que as despesas com eventos foram elevadas em razão da realização da convenção nacional, “ou seja, toda a infraestrutura necessária para realização de um evento nacional, na qual contou com a participação aproximada de 1.000 a 2.000 participantes”.

A Folha não conseguiu falar com Eunício Oliveira.

O PSDB disse que as multas foram pagas com recursos próprios, não dinheiro público. Sobre as pesquisas, afirmou que faz parte da rotina de qualquer partido “buscar aferir (…) opiniões e posicionamentos da sociedade, especialmente quando este partido (…) governa cerca de 50 milhões de brasileiros”.

O PSD disse que gastos com aluguéis de imóveis servem para as atividades partidárias e reforça que tem ampla estrutura na maioria dos estados.

A direção do Republicanos afirmou que mudou a localização de sua sede no início de 2019, para um local com espaço físico ampliado, “de modo a adequar às diretrizes futuras traçadas pela Comissão Executiva Nacional, bem como, às novas atividades de educação superior e cursos de extensão que serão praticados pela Fundação Republicana Brasileira”. Para tanto, afirma, “investiu nesta mudança o valor total de R$ 988 mil, entre compra de mobiliário, equipamentos de informática e audiovisuais e outros”.

Em nota, o Pros afirmou que “é um dos partidos mais bem estruturados do país, com sede própria e um moderno parque gráfico que gera relevante economia na confecção de materiais para as campanhas”.

“Sobre o veículo, trata-se de uma van para transporte de funcionários e filiados para atividades partidárias. Cabe destacar que, ao adquirir esse novo veículo, o anterior foi vendido por cerca de R$ 90 mil”, diz.

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