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Para o bolsonarismo digital, medidas contra pandemia são autoritarismo

O discurso é feito por comunicadores que costumam relativizar o golpe de 1964 e a ditadura militar, e sobre os quais sempre pairou a suspeita de defesa de um endurecimento por parte de Bolsonaro


Por Folhapress Publicado 03/04/2020
Presidente da República, Jair Bolsonaro durante Videoconferência com Governadores do Centro-Oeste. Foto: Marcos Corrêa/PR

Expoente da tropa de choque digital de Jair Bolsonaro, o jornalista Allan dos Santos bradou no Twitter, na quarta-feira (1): “O Estado Democrático de Direito morreu de Covid-19”.

Desde que os governadores adotaram medidas de isolamento social, com fechamento do comércio e a proibição de aglomerações, o discurso de que o Brasil caminha para uma ditadura se espraiou pelo conservadorismo mais alinhado ao presidente.

Para alguns ativistas, o fim das liberdades democráticas já está entre nós.
O discurso é feito por comunicadores que costumam relativizar o golpe de 1964 e a ditadura militar, e sobre os quais sempre pairou a suspeita de defesa de um endurecimento por parte de Bolsonaro.

Agora, decidiram contra-atacar com as mesmas armas, dizendo a seus oponentes ideológicos que autoritários são eles.

Por esse discurso, a suposta ditadura que se aproxima seria comunista, mais especificamente chinesa, país onde o vírus surgiu. E poderia levar a uma reação.

O mesmo Allan dos Santos que apontou o fim do Estado democrático de Direito lançou uma enquete online perguntando: “Você acha que Bolsonaro deveria pedir intervenção militar no Brasil?”.

“Eu acho que não, mas queria ouvir meus seguidores”, ressalvou. Até a tarde desta quinta (2), mais de 44 mil pessoas haviam participado da votação, que se encerra no sábado (4).

Responsável pela área de direitos humanos na Procuradoria-Geral da República, o procurador Ailton Benedito listou uma série de medidas que em seu modo de ver minam a democracia e que estão sendo implementadas sob a justificativa de combater a pandemia.

Entre elas, mencionou a proibição do exercício da liberdade de pensamento, locomoção e expressão e o controle estatal sobre a atividade econômica.

“Tudo isso sem decretação de medida excepcional do Estado de Sítio. Em que país estamos mesmo?”, perguntou Benedito.

As maiores queixas dos conservadores se referem a restrições de mobilidade, veto ao trabalho de comerciantes, proibição de carreatas e a retirada de posts de redes sociais por espalharem notícias falsas.

“Em diversos lugares do país, agentes públicos usam a epidemia de coronavírus para atacar as liberdades individuais e o direito ao trabalho, condenando o povo ao silêncio e à fome”, escreveu o jornal online Brasil Sem Medo, ligado ao escritor Olavo de Carvalho, em 28 de março, sob o título “O Vírus da Tirania”.

Vários exemplos dessa “tirania” vêm sendo explorados pela direita bolsonarista. Em 27 de março, a proibição de uma carreata em Criciúma (SC) que defenderia a reabertura parcial do comércio foi denunciada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

“Não podemos de maneira nenhuma vender nossas liberdades, ainda mais com base num cenário futuro sem certeza científica”, disse.

Também causou espécie a prisão de um empresário em Paraty (RJ) por ter tentado distribuir cestas básicas para 200 pessoas, apontada pela deputada Bia Kicis (PSL-DF) como exemplo de autoritarismo.

Da mesma forma, a decisão do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), de não permitir uma carreata em Belém no domingo (29) recebeu severas críticas.

“Hoje o ditadorzinho Helder Barbalho prendeu 11 pessoas por exercerem seu direito de se manifestar. Veja o aparato policial utilizado contra cidadãos que não aceitam a imposição do governador!”, atacou Edson Salomão, presidente do Movimento Conservador, aliado do presidente.

Uma referência constante dos apoiadores de Bolsonaro tem sido o livro “1984”, do escritor britânico George Orwell, que, ironicamente, era um socialista convicto, embora oponente do totalitarismo soviético.

Publicada em 1949, a obra mostra um futuro distópico em que a vida dos cidadãos é totalmente controlada pelo Estado.

Ela vem sendo invocada pela direita pró-Bolsonaro para denunciar a ação de empresas de mídia como Twitter, Facebook e Instagram, que removem textos considerados falsos e disseminadores de desinformação na atual crise.

Isso ocorreu com o próprio presidente Bolsonaro, que teve removido conteúdo referente ao seu passeio por cidades-satélites de Brasília no último domingo.

A atitude do Twitter rendeu à rede a alcunha de “passarinho vermelho”, dada por conservadores, em referência ao símbolo da empresa.

Também houve protestos quando uma postagem do apresentador de TV bolsonarista Sikêra Junior, da RedeTV!, foi excluída pelo Facebook.

“A ditadura ataca por todos os lados. 1984 é fichinha perto do que estamos vivendo hoje em dia”, reclamou o empresário e ativista conservador Leandro Ruschel.

Por esse raciocínio, o Brasil estaria se encaminhando para um regime socialista, em que as liberdades individuais são restritas e os trabalhadores passam a ter de depender do Estado, uma vez que sua fonte de renda secou.

É um modelo oposto ao que defendem conservadores e liberais que se uniram para eleger Bolsonaro, o que explica a reação tão virulenta da direita que segue apoiando o presidente.

Como resumiu num post o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), espécie de coordenador das redes de apoio a seu pai.

“O desenho é claro: partimos para o socialismo. Todos dependentes do Estado até para comer. […] Conseguem a passos largos fazer o que tentam desde antes de 1964”, escreveu na quarta (1º).

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