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Estudo confirma que barragem da Vale se rompeu por liquefação

Houve dois gatilhos para o rompimento: um efeito de deformação natural (chamado "fluência") e uma perda de sucção que deixou os materiais menos resistentes


Por Folhapress Publicado 12/12/2019
Reprodução (PM)

A barragem da mineradora Vale que se rompeu em janeiro em Brumadinho (MG) e deixou 270 pessoas mortas colapsou por liquefação (quando um material rígido passa a se comportar como fluido), de acordo com estudo contratado pela empresa.
Houve dois gatilhos para o rompimento: um efeito de deformação natural (chamado “fluência”) e uma perda de sucção que deixou os materiais menos resistentes, segundo o relatório.

A conclusão está no Relatório do Painel de Especialistas Sobre as Causas Técnicas da Barragem 1 do Córrego do Feijão, assinado pelos pesquisadores Peter K. Robertson, Lucas de Melo, David J. Williams e G. Ward Wilson.
O relatório foi divulgado nesta quinta-feira (12) e, segundo seus autores, não pode apurar responsabilidades, mas apenas as causas técnicas para que causaram o colapso da estrutura.

“Com base nos documentos analisados, está claro que os consultores [da Vale] sabiam do alto nível de água e do risco disso”, mas estavam tomando as ações necessárias “com base nas evidências que eles tinham”, afirmou Robertson.
A barragem se rompeu em 25 de janeiro, em menos de dez segundos, e despejou 9,7 milhões de metros cúbicos de rejeitos em menos de cinco minutos, o equivalente a 75% do conteúdo da estrutura.

Os materiais retidos na barragem apresentavam comportamento frágil, diz o relatório, fazendo com que perdessem resistência. “Fica claro que o rompimento foi resultado de liquefação estática dos materiais.”
A liquefação era a principal hipótese para o rompimento apontada tanto por especialistas quanto pelas investigações.
Foi esse também o motivo do rompimento da barragem de Mariana, em 2015, da mineradora Samarco -que tem a Vale como uma de suas donas-, quando 19 pessoas foram mortas.

A falta de recursos de drenagem significativos, segundo o estudo, e a presença de rejeitos menos permeáveis resultaram em um nível de água alto na barragem da Vale de Brumadinho. Embora a empresa tenha parado de depositar rejeitos desde 2016, esse nível não se reduziu significativamente, sobretudo no pé da estrutura.
De acordo com o painel de especialistas, uma descoberta significativa do relatório foi que os rejeitos dispostos ali tinham teor de ferro superior a 50%, considerado muito alto. Isso deixou os rejeitos pesados e “predominantemente fofos, saturados e contráteis” (capazes de sofrerem contração). Esse material poderia perder resistência facilmente, segundo o relatório, e passar por cimentação.
Testes em laboratório mostraram que amostras fofas de rejeitos, quando submetidas a cargas constantes, acumulam deformações -fenômeno conhecido por “creep” ou fluência. A cimentação “torna os rejeitos rígidos e potencialmente com comportamento frágil”, diz o estudo.

Essas características todas, quando combinadas, resultam em um material que pode perder resistência significativa e rapidamente.
Partes significativas da barragem tinha alta tensão, por três motivos: a inclinação da estrutura, o alto peso do rejeito e o alto nível da água.
“A combinação de uma barragem íngreme construída a montante [alteada sobre ela própria], alto nível de água, rejeitos finos fracos dentro da barragem e a natureza frágil dos rejeitos gerou as condições para o rompimento.”
Forte precipitação no período chuvoso, de outubro de 2018 em diante, fez com que a estrutura perdesse sucção, tornando os materiais menos resistentes.

“As simulações mostraram que o ‘creep’, quando combinado com a perda de sucção discutida acima, seria suficiente para desencadear o rompimento global da barragem”, diz o relatório.
O estudo descartou gatilhos humanos ou sísmicos para o rompimento.
Não houve tremor de terra naquele dia, segundo o relatório. Houve detonações em minas a céu aberto na área, mas nenhuma que fosse registrada pelo sismógrafo (medidor) mais próximo à barragem antes do rompimento -houve uma naquele dia, mas minutos após a estrutura se romper, segundo Robertson.

Entre outubro de 2018 e o fim de janeiro, quando a barragem se rompeu, a Vale fez nove furos de sondagem na estrutura, para instalar inclinômetros e piezômetros (medidores de pressão). Segundo o painel de especialistas, a barragem não mostrou sinais de instabilidade durante essas perfurações. No momento do rompimento, trabalhadores perfuravam a estruturam com uma sonda, mas simulações computacionais indicaram que isso não teria capacidade para desencadear o rompimento.
Apesar disso, a Vale ainda é cobrada por autoridades e familiares das vítimas por manter a estrutura administrativa da mina nas imediações da barragem (a maior parte dos mortos estava ali) e pelas falhas nos procedimentos de emergência (as sirenes de alerta não dispararam, por exemplo).
Além disso, como dona da estrutura, a mineradora era responsável por monitorar suas condições de estabilidade.​

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