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DPVAT repassou R$ 266 milhões a sindicatos de corretores, diz denúncia

A Líder, responsável pelo recurso do DPVAT desde 2008, apontou que, em relação aos repasses referentes à corretagem, atendeu às determinações do Conselho Nacional de Seguros Privados


Por Folhapress Publicado 29/02/2020
Foto: Reprodução

Mesmo sem a atuação de corretores em sua venda, o seguro DPVAT teria repassado R$ 226 milhões ao longo de mais de 20 anos a entidades sindicais ligadas a essa categoria. O valor é apontado em denúncia feita pelo SindSusep (sindicato dos funcionários da Susep) à Polícia Federal, a qual a Folha de S.Paulo teve acesso.

Ainda de acordo com a denúncia, sindicatos de corretores teriam influência sobre a Susep (Superintendência de Seguros Privados), o órgão regulador do setor.

O SindSusep sustenta na denúncia que o DPVAT é um seguro obrigatório, que não é comercializado por meio de uma proposta de corretor e por isso não deveria pagar comissão a corretores de seguros.

A Fenacor (Federação de Corretores de Seguros) afirma que os valores pagos aos sindicatos não são comissões de corretagem, mas pagamentos por serviços prestados pelos corretores a famílias das vítimas. Valores de comissões seriam devidos apenas nas vendas de seguros a empresas de transporte coletivo.

O sindicato questiona os repasses e diz ainda que teria havido conflito de interesses nas decisões do órgão regulador.

O mesmo grupo estaria no comando do Ibracor (Instituto Brasileiro de Autorregulação do Mercado de Corretagem de Seguros), entidade que deve substituir a Susep no registro de novos profissionais caso a MP 905, da carteira Verde e Amarela, implante o modelo de autorregulação. A MP está em discussão no Congresso.

A denúncia fala que ao longo dos anos a Susep teria tomado decisões que qualificaram como controversas, dadas por seus conselhos diretores, que não teriam considerado recomendações do corpo técnico da autarquia e apresentaram supostos indícios de irregularidades.

Na mira do governo, o DPVAT é o seguro obrigatório que indeniza vítimas de acidentes de trânsito no país. É gerido pela Líder, consórcio de seguradoras responsável pela arrecadação e pagamento das indenizações.

Desde janeiro, a Folha de S.Paulo vem publicando uma série de reportagens sobre o mau uso dos recursos arrecadados pelo seguro, que serviram de base para pedido de investigação feito pelo MPF (Ministério Público Federal) ao TCU (Tribunal de Contas da União).

Fenacor (Federação Nacional dos Corretores) e sindicatos estaduais da categoria receberam os repasses desde 1995.

Os trabalhadores da Susep dizem que os pagamentos foram feitos sem questionamento da direção do órgão regulador. Com base em resolução do CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados), tiveram direito a percentuais entre 0,5964% e 1,5% da arrecadação total entre 1995 e 2004, quando o pagamento foi suspenso a pedido do Ministério Público Federal.

Depois, segundo a denúncia, a Fenaseg (Federação Nacional das Seguradoras), que na época geria o DPVAT, celebrou convênio com a Fenacor para prestar serviço com objeto igual ao prestado pelos sindicatos de corretores, em valores dobrados.

Ao fim do governo Temer, em 2018, a taxa de corretagem do seguro DPVAT foi reduzida para 0,01%. Em 2019, Bolsonaro tentou extinguir o seguro, mas a proposta foi suspensa pelo Supremo a pedido do partido Rede.

Os servidores da Susep alertaram a PF sobre uma série de decisões supostamente benéficas aos corretores nos períodos em que as lideranças sindicais comandava o órgão regulador. Presidente da Fenacor desde 2002, Armando Vergílio foi superintendente da Susep entre 2007 e 2010, quando dirigia o sindicato dos corretores de Goiás. Ele deixou o cargo para concorrer a deputado federal e foi substituído por Paulo dos Santos, que era presidente do Ibracor.

Em 2016, a superintendência da Susep foi dada a Joaquim Mendanha, que também era presidente do sindicato dos corretores de Goiás, já então ligado ao Solidariedade, quando foi nomeado para comandar o órgão regulador.

A nomeação foi anunciada em notícia no site do Solidariedade de Goiás. “É a segunda vez na história da entidade que um representante do mercado de seguros goiano assume seu comando [da Susep]”, diz o texto.

Mendanha também foi dirigente da Fenacor e hoje preside o Ibracor. Ele é citado na denúncia como um dos diretores a adotarem medidas supostamente protelatórias a uma revisão do convênio entre Susep e corretores. Na sua gestão à frente da Susep, dois outros diretores eram ligados ao mercado de corretores de seguros, também segundo a denúncia dos funcionários à PF.

De acordo com o documento, em 2012 a Susep suspendeu convênios e repasses à Fenacor e ao Sincor (sindicato dos corretores) até que requisições da equipe de fiscalizações fossem atendidas pela seguradora Líder, gestora do recurso.

O conselho diretor da superintendência, então, teria tomado decisões sem consultar equipes técnicas, causando duplicidade em remunerações de sinistros e prejuízo ao consumidor.

Federação diz que entidades atendiam vítimas de acidentes

OUTRO LADO
Em nota, a Fenacor disse que a atuação dos sindicatos estaduais ocorreu durante 23 anos e garantia “um atendimento humanizado e gratuito, em todo o país, visando a orientação, a informação, a recepção de documentos e avisos de sinistros a todas as vítimas de acidentes e seus beneficiários”. Segundo a Fenacor, a atuação dos corretores tinha o objetivo de evitar que atravessadores pudessem se aproveitar de uma situação de fragilidade das famílias no momento de acidentes.

A entidade diz ainda que os sindicatos firmavam convênios de colaboração com Procons estaduais e municipais, polícias civil e militar, secretarias de segurança pública e Ministério Público. A Fenacor diz que os valores pagos aos sindicatos nada têm a ver com comissões de corretagem, por se tratar de pagamentos e reembolsos por serviços efetivamente prestados.

Ela aponta que no valor citado pela reportagem deve estar incluída a comissão de corretagem devida aos corretores de seguros que atuavam nas categorias 3 e 4, de ônibus e micro-ônibus. A entidade diz que era prestada assistência às empresas de transporte coletivo em acidentes envolvendo ônibus com elevado número de vítimas, muitas vezes em localidades de difícil acesso.

Segundo a Fenacor, nas categorias 3 e 4 o DPVAT era comercializado por corretores de seguros por solicitação dos proprietários desses veículos de passageiros.

A Líder, responsável pelo recurso do DPVAT desde 2008, apontou que, em relação aos repasses referentes à corretagem, atendeu às determinações do CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados), órgão ligado ao Ministério da Economia, que estabeleceram um percentual do valor arrecadado do seguro a ser repassado aos corretores.

Procurado, o SindSusep não quis comentar a denúncia.

A atual diretoria da Susep disse que as despesas do DPVAT estão em análise e que possíveis desconformidades serão objeto de ressarcimento.
A reportagem também tentou contato com o Ibracor, que tem Mendanha como presidente, mas não conseguiu até a publicação deste texto.

O que é o DPVAT?
É o seguro obrigatório que indeniza vítimas de acidentes de trânsito no país
É gerido pela Líder, consórcio de seguradoras responsável pela arrecadação e pagamento das indenizações e 4,5 milhões de pessoas foram indenizadas em dez anos. Além de indenizações por mortes, também cobre gastos hospitalares e sequelas permanentes

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