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Tremi ao bater pênalti do gol mil, afirma Pelé

Pelé comemora nesta terça (19) os 50 anos do milésimo gol, que entrou para a história como tendo sido marcado em 19 de novembro de 1969, no Maracanã, numa partida contra o Vasco


Por Folhapress Publicado 18/11/2019
Divulgação

A sala de espera de Pelé, 79, em seu museu em Santos (SP), não está distante da variedade de visitantes de um rei em dia de recepção pública.

Depois de meses distante de eventos e entrevistas, devido a complicações na saúde, Pelé recebeu ao longo de quase oito horas amigos, ex-jogadores do Santos, documentaristas, jornalistas e desconhecidos.

Às 22h, seis horas depois de abrir as portas, ele estava sentado numa cadeira de pernas altas, ainda bem tranquilo, sorrindo com um vídeo no celular. Na mesa central, fotos com a família e uma coroa dourada. Ao fundo, um retrato do rei do futebol a óleo.
Pelé comemora nesta terça (19) os 50 anos do milésimo gol, que entrou para a história como tendo sido marcado em 19 de novembro de 1969, no Maracanã, numa partida contra o Vasco.

Em 1995, reportagem do jornal Folha de S.Paulo revelou que a façanha não ocorreu nesse dia. O erro de cálculo aconteceu porque a estatística oficial ignorou um gol feito em seus primeiros anos de carreira, em 1959, quando o atleta estava no serviço militar e defendia a seleção do Exército.

O ex-jogador do Santos e ex-ministro dos Esportes relembra à reportagem o gol mil e avalia os casos de racismo no futebol, a atuação de Maradona como técnico e a experiência de treinadores estrangeiros no Brasil.
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Pergunta – Com o envelhecimento, você se sente mais distante do mito Pelé?
Pelé – Não há uma diferença muito grande no meu convívio. Eu sempre respeitei todo mundo. Graças a Deus, qualquer país que eu vou me recebe muito bem. Nunca fiz inimizade com ninguém. É até um prêmio de Deus. Toda hora tem um convite para fazer alguma coisa na China, no Japão…

Você não viajará mais? Tomou essa decisão?
P – Não tenho viajado mais por causa da operação, da cirurgia. Foram três cirurgias. Eu até brinco: Deus foi bom comigo. Depois que eu parei de jogar futebol, ele mandou tudo que tinha de mandar de fratura, de cirurgia, de coluna. Graças a Deus foi nesses últimos três anos, dois anos e meio.

Em campo, você teve muitos momentos intensos. Um deles faz 50 anos no dia 19 de novembro: o milésimo gol. Outro episódio aconteceu em 1977, na sua despedida do Cosmos, em que você disse “love, love, love”. Como foram esses dois momentos diferentes? O que você lembra deles?
P – Essa coisa da recepção do americano com “love, love, love”, eu acho que para quem não é do país foi uma das maiores homenagens que eu pude ter. No Brasil eu tinha certeza. Até eu brinco: só os corintianos não gostaram, porque eu fiz o Corinthians sofrer muito [sorri]. Mas agora, falando sério, eu jamais esperava que o americano, que é um povo meio frio e que tem muitos artistas… O futebol não é o maior esporte lá. É o beisebol, o futebol americano.

Você dormia ao ver os jogos de beisebol?
P – De vez em quando a gente ia ver e falava: “Vamos dar uma descansada, uma cochilada aqui?”.

Esses foram os momentos mais fortes com o público?
P – Ah, foi. O milésimo gol, de pênalti… Todo mundo fala que bater pênalti é fácil. Mas é fácil quando está dois a zero, três a zero. Mas tremer como eu tremi quando fui bater meu pênalti… Duvido que alguém já tenha passado por isso. Eu falava: “meu Deus do céu, e se eu perder o pênalti?”. O mais engraçado é que eles fizeram uma homenagem, mas ninguém ficou na área. Quando olhei para trás, estava todo o time no meio de campo. Eu falei: pô, se bate na trave ou o goleiro rebate, meu time está todo lá atrás. Falei: caramba, ninguém veio!

O que você está achando de Jorge Jesus, um técnico estrangeiro com sucesso no futebol brasileiro?
P – Já tiveram alguns técnicos estrangeiros no Brasil, mas nessas condições acho que não teve nenhum técnico no Brasil que se comparasse a esse. O Santos está em terceiro lugar, pode até não ganhar, mas está com um time. Ele [Jorge Sampaoli] montou um time que todo mundo achava que não ia dar certo, só com jogadores estrangeiros. E eu acho que deu certo. Então foi uma surpresa muito grande.

Soube que Maradona voltou a ser técnico na Argentina?
P – Vi, acho que Pepito [assessor] me passou isso na semana passada. Eu falei: “Pepito, se tem uma coisa que eu jamais vou voltar a fazer é ser técnico”. Profissional, não. Juvenil, infantil, amador, até trabalhar com criança, tudo bem. Mas profissional… Eu acho que essa loucura não vou fazer, não. Deus foi muito bom para mim para eu fazer essa loucura.

Você tem acompanhado os casos de racismo em estádios? Houve o episódio de Balotelli, na Itália, agora contra Taison, na Ucrânia, e outros no Brasil. O que pode ser feito para enfrentar o racismo no futebol?
P – Já tivemos isso há um tempo atrás e achavam que as coisas eram por causa do tempo. Agora que estamos no mundo moderno está acontecendo mais ou menos a mesma coisa. Mesmo uns absurdos que aconteceram no Maracanã, negócio de guerra, de briga, são coisas tristes que acontecem no futebol. O que eu acho é que tem que se tomar alguma decisão mesmo.

De punição?
P – Exato. Nós, os seres humanos, estamos ficando um pouco diferentes. Infelizmente, essas coisas que estão acontecendo agora não deviam acontecer mais, né?

Em relação ao período em que você foi jogador, essas manifestações racistas mudaram ou ainda são tão intensas quanto no passado? De racismo e de homofobia.
P – Eu acho que teve alguma mudança, mas infelizmente não chegou ao que eu acho que deveria ser para um esporte, para qualquer esporte, uma coisa de pessoas que não são doidas e estão juntas, participando de uma festa. É triste. Eu joguei em vários lugares. Graças a Deus nunca tive nenhum problema. Até na Argentina, que era uma rivalidade danada contra o Brasil, já tive jogo contra o Boca, contra o River, e não passamos por isso.

Você é o brasileiro mais conhecido no mundo e já teve uma participação política direta no Ministério dos Esportes. Como você avalia o momento político do Brasil?
P – Triste. Muito triste. Tá pior que o futebol. Embora a gente tenha alguns títulos que ainda dá para ganhar… Vamos torcer pro Flamengo ser campeão agora [da Libertadores]. Tem o Brasil, tem o Flamengo. Mas na política está triste.

Você sente uma regressão?
P – Totalmente. Porque está sem rumo. Isso é triste porque você não sabe exatamente quem apoiar. Está numa situação muito difícil.

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